com informações da Editoracerrado
A desembargadora Sandra Inês Azevedo, do Tribunal de Justiça da Bahia (TJBA), suspendeu a sentença da juíza Marivalda Almeida Moutinho que dava a uma única pessoa, a posse de 366 mil hectares de terra na região da Coaceral em Formosa do Rio Preto.
Publicada na quinta-feira, 31 de janeiro, a desembargadora aponta que a decisão de Marivalda foi tomada “em total desrespeito” a uma ordem anterior do TJBA, além de evidenciar “total desatendimento aos preceitos legais.”
O processo tem como litígio as terras da região da Coaceral, no município de Formosa do Preto. Na mesma decisão, o tribunal também tornou sem efeito a sentença em que a juíza condenou o advogado Domingos Bispo a pagar uma multa no valor de uma milhão de Reais, por litigância de má fé, por este ter ajuizado um incidente de suspeição contra a magistrada.
Segundo a desembargadora Sandra Inês Azevedo, a juíza decidiu em flagrante afronta a legislação, visto que sentenciou um processo que se encontrava suspenso pelo juízo de segundo grau e julgou um incidente de suspeição contra ela mesma.
A região de Formosa do Rio Preto começou a receber, ainda na década de 1990, agricultores vindos do Paraná, por meio do Programa de Cooperação Nipo-Brasileira para o Desenvolvimento dos Cerrados (Prodecer II), que se destinava a criar novas fronteiras agrícolas no Cerrado brasileiro.
Inicialmente, o juiz Sérgio Humberto de Quadros Sampaio, que atuava em Formosa do Rio Preto, deu uma liminar (decisão provisória) transferindo a posse das terras a José Valter Dias e determinando a saída de todos os 300 agricultores do local. A decisão foi proferida sem que os agricultores nem o Ministério Público fossem ouvidos, o que foi questionado por ambos. Posteriormente, o juiz deixou a causa declarando-se suspeito para julgá-la.
Em dezembro, a desembargadora Sandra Inês Azevedo suspendeu a liminar, revertendo a posse aos agricultores.
Apesar disso, ao ser designada pelo TJBA para atuar por apenas um mês em Formosa do Rio Preto, a juíza Marivalda Moutinho ignorou a decisão da desembargadora Sandra Azevedo, de instância hierarquicamente superior, e proferiu uma sentença de mérito confirmando a liminar – ainda que sem ouvir as partes envolvidas – e revertendo toda a área a José Valter Dias, em prejuízo dos agricultores.
Ao mesmo tempo, em outra decisão que causou estranheza, Marivalda aplicou multa de R$ 1 milhão a uma das partes que apontou sua suspeição para julgar o processo. O pedido de suspeição afirmava que a juíza manteria vínculos com Adailton Maturino, que se apresenta como mediador de conflitos agrários e cônsul da Guiné-Bissau no Brasil (o Itamaraty nega que ele tenha esse título). A mulher de Adailton, por sua vez, virou sócia de José Valter Dias em uma holding criada logo que ele virou o “dono” das terras, com base na liminar do juiz Sérgio Sampaio. A holding vem cobrando de 20 a 80 sacas de soja por hectares de agricultores para que possam permanecer no local.
Ao suspender a sentença, a desembargadora Sandra Inês Azevedo apontou que Marivalda agiu de forma totalmente irregular ao julgar o pedido de suspeição contra ela própria. A desembargadora explicou que, diante de um pedido de suspeição, o juiz pode tomar duas providências: ou declarar-se suspeito, encaminhando o processo imediatamente a um substituto, ou encaminhar o pedido para análise pelo tribunal de instância superior – o que não foi feito no caso.
– Não tendo sido tomada qualquer das providências, seja declarar-se suspeita ou encaminhar o incidente ao Tribunal de Justiça, imperativa se faz a concessão da liminar em mandado de segurança, até porque a sentença proferida mostra-se teratológica por inexistir, no direito, a previsão de que o próprio juiz sentencie a exceção de suspeição contra si proposta – concluiu a desembargadora.