O Facebook divulgou ontem (18) os detalhes de sua iniciativa para criação e gestão de uma criptomoeda própria, que ganhou o nome de libra. O projeto é capitaneado pela plataforma, mas também ganhou a participação de outras companhias, como Mastercard, Visa PayPal, eBay, MercadoPago, Uber e Spotify.
A libra estará disponível a quem tiver um smartphone e conectividade com a internet, em todo o mundo. As operações poderão ser realizadas, segundo os responsáveis, entre consumidores e empresas em diferentes lugares do mundo.
O objetivo do Facebook e da rede, que ganhou o nome de Associação Libra, é permitir operações financeiras usando a internet e aplicativos diversos, como os da empresa (a rede social de mesmo nome, o Messenger, o Instagram e o WhatsApp). A expectativa é que a critptomoeda esteja disponível em 2020.
De acordo com o Facebook, um dos propósitos é oferecer alternativas desse tipo a quem hoje não tem conta em banco, cerca de 1,17 bilhão de pessoas, o que equivale a 31% da população global. No documento técnico divulgado, o Facebook aponta como obstáculo a ser superado o cenário de altas taxas para operações financeiras e empréstimos.
A libra usará a tecnologia Blockchain, de trocas distribuídas, que dá suporte a outros tipos de criptomoeda, como o bitcoin. Segundo o documento técnico, a libra será lastreada em um fundo formado por ativos em moedas importantes e estáveis. O texto não detalha, porém, quais moedas e que tipo de ativos.
“Diferentemente da maioria das criptomoedas, a libra é totalmente respaldada por uma reserva de ativos reais. Um cesto de depósitos bancários e títulos públicos de curto prazo será mantido na reserva libra para cada libra criada, gerando confiança em seu valor intrínseco. A reserva libra será administrada com o objetivo de preservar o valor da libra ao longo do tempo”, explica o documento da Associação Libra.
O Facebook anunciou também uma “carteira” para comprar, poupar, transacionar e gastar a libra, de nome Calibra. Por meio da aplicação, será possível enviar libras a outros contatos que o usuário possui na rede social. No futuro, a expectativa da companhia é possibilitar outras operações, como o pagamento de contas e a realização de compras.
Expectativas
Na avaliação do professor de economia da Universidade de Brasília (UnB) e autor de tese sobre o tema Edemilson Paraná, o arranjo construído pelo Facebook em parceria com grandes operadoras do mercado financeiro (como Visa, Mastercard e PayPal) traz uma solução mais estável e previsível, mitigando um dos principais problemas das criptomoedas, a falta de confiança de consumidores e instituições financeiras.
Com a aposta em uma moeda própria, diz o professor, o Facebook foi além de apenas oferecer um meio de pagamento digital (como o próprio PayPal ou serviços de concorrentes, como o Google Pay). Isso pode sugerir um movimento de busca por mais autonomia em relação a bancos e a estados. A iniciativa pretende operar de forma análoga a um estado nacional, em uma solução inovadora, mas que busca dialogar com as estruturas postas. Ao mesmo tempo que sinaliza um produto que pode ter um caráter disruptivo, estrutura a nova moeda com grandes operadores do mercado, como Visa e Mastercard.
Edemilson Paraná destaca que ainda é cedo para prognósticos, já que o sucesso da empreitada depende de uma série de fatores. O primeiro é o poder e a atuação dos estados na definição das regras para os sistemas financeiros nacionais e internacional. Para operar junto a consumidores e empresas, a nova moeda precisa estar aderente às normas de cada sistema monetário nacional (com seus ministérios da Fazenda, bancos centrais e outras instituições).
Outro desafio é a capacidade de adoção pelas pessoas. O Facebook tem mais de 2,3 bilhões de usuários em todo o mundo, o que é uma base bastante representativa. Além disso, Visa e Mastercard também têm atuação em escala internacional. Contudo, a popularização de uma nova moeda depende de que os agentes econômicos passem a utilizá-la para transações diversas, como compra e venda.
“O Facebook têm uma rede gigante para começar e parceiros importantes, mas ainda é preciso ver como isso vai evoluir. A iniciativa esbarra na queda de braço com os estados nacionais, que não querem abrir mão de sua soberania monetária. Acho que pode caminhar para ser semelhante ao WeChat na China, um sistema de compras, pagamento e transferência sem sair do Facebook”, diz o professor da UnB.
À Agência Brasil a a assessoria do Banco Central respondeu que não iria comentar sobre os impactos do projeto para o mercado financeiro brasileiro.